PAUSE 71 | Não se chame de blogueira
Um guia realista de marca pessoal para quem preferiria estar nos anos 90. Uma metáfora culinária para diminuir o ritmo. E umas refs para o nosso Clube <3
Ei, tudo bem por aí?
Antes de ir para o conteúdo em si, quero lembrar que hoje a newsletter vem com os novos recheios para assinantes.
Como contei na terça, agora PAUSE é tudo isso aqui:
(gratuito) PAUSE PRA PENSAR - o texto-inspiração, a pensata da semana.
(versão paga) PAUSE PRA CRIAR - a sessão mais útil, por assim dizer, na qual trago temas de carreira, branding pessoal e afins.
(versão paga) PAUSE PRA LER - o nosso Clube do Livro e do Repertório, a Comunidade Pause, que inicia suas interações neste mês de setembro com encontros virtuais para leitura e debate.
Combinado?
Se você já é assinante, obrigada e vamos juntas! Se ainda não é, fica o convite!
PAUSE PRA PENSAR
Receita à moda antiga
Que prato delivery nenhum pode te entregar?
Eu começo.
O PF “arroz, feijão, carne moída, abobrinha e quiabo” da minha mãe. Posso pedir esses elementos no aplicativo, mas não vão vir com o gosto do que a Ana Lúcia faz, nem cortadinho do mesmo jeito. Comida de mãe tem o componente afetivo, reconheço... Então, recorro a outro exemplo.
Não consigo pedir em lugar nenhum o espaguete do MEU jeito, al dente com molho temperadíssimo e espesso. Eu amo a minha própria massa, e quando bate o desejo dela, sou obrigada a ir para a cozinha eu mesma. Amor próprio, autoestima delirante ou talento para a cozinha? Olha, acho que é mais uma questão de curtir o processo e prever o resultado. Eu cozinho massa há muito tempo, porque adoro, e conheço meu próprio gosto, logo…
Gosto de cozinhar sem pressa, porque as etapas de fato importam para eu relaxar e o sabor do molho ser ressaltado. A água salgada fervendo. As especiarias que vou testando na hora. Aquele grudadinho no fundo da panela que é puro ouro. As coisas levam tempo para ficarem boas. Aprendi na boca do fogão que a química precisa fazer sua mágica.
Na cozinha, a gente sabe disso.
Por que nas outras esferas da vida teimamos em cortar sem padrão e pular o cozimento?
Por que estranhamos quando o “delivery” não entrega o que pedimos, sendo que muitas vezes o que queríamos nem constava no menu?
Estamos tão apressados. Impacientes. Comendo cru e queimando a língua.
Pensei nisso assistindo dia desses a “O Sabor da Vida", um bem cotado filme francês disponível na Prime Video. O ritmo do longa é o mesmo da cozinha real. Não aquela toada frenética e editada dos restaurantes retratados em séries ou realities. A nossa cozinha, a da mãe, da avó, a dos bastidores. Aquela com caldos de muitas horas, processos sequenciais, ingredientes depurando, técnicas se sobrepondo.
No longa, acompanhamos o lado menos frenético dessa arte. A dança culinária não é nenhum funk; está mais para uma valsa - ensaiada, graciosa, parcimoniosa. Quem perder o passo, que se aprume e retome o posto.
Mais sobre o filme não conto, para não estragar a experiência.
Voltando à vida, à minha mesmo, fiquei pensando em como o ritmo dessa culinária elaborada e raiz, à francesa, tem a ensinar.
Se você quer um banquete do qual se orgulhar, prepare-o. Cuide da mise en place à apresentação e terá uma experiência memorável, além de uma história boa para contar através dos sentidos. Gaste um dia inteiro preparando o que vai sumir na boca em segundos e se sentirá satisfeito com isso. Equilibre, reduza, complexifique rigorosamente para o prato parecer simples.
O prazer da missão deve ser degustado no processo, pois mora mais no caminho que no final. Quem já atingiu um grande objetivo conhece o retrogosto amargo do cheguei-lá. Uma garfada saborosa e, pronto, já se foi.
Não se pode medir o sucesso de uma refeição pela efemeridade do consumo. Mais vale o impacto que causa, a experiência gravada na memória. Mais vale ainda, teimo em dizer, todo o processo por trás de um prato.
Estou sendo óbvia, que bom. É uma metáfora evidente mesmo.
Ir para o fogão. Vez ou outra até se queimar. Anotar o deslize no caderno de receitas para não repetir o erro. Tirar tudo do ingrediente, sem desperdício. Praticar a presença em cada etapa, atentar aos detalhes e se certificar de ter um bom resultado, mesmo se for para demorar mais. Amanteigar tudo, para dar brilho, realçar o sabor.
Coisas que soam fora de moda, cafonas até. Mas são, como a cozinha francesa, atemporais, clássicas.
O amanteigar, fora da panela, seria quem sabe o equivalente do je né sais quoi, um charme intraduzível e despretensioso, um jeito autêntico e leve de levar a vida…
Tem manteiga aí? Com ou sem sal?
Na metáfora ou na literalidade, sabemos que, quando alguém gasta tempo no bastidor - se preparando, construindo - tende a ter um resultado mais sólido.
Claro que nem tudo segue essa lógica no nosso mundo, não por acaso, chamado de líquido. Existem as horas de comer Mac no delivery, por certo. E existem as horas de preparar um ensopado de 7 horas. Diferenciar os dois momentos tem sido dificílimo para a maioria das pessoas.
Mas que empobrecedor seria a viver a vida exclusivamente no modo fast food!
Se eu puder apostar o que vale o meu tempo de “chef na vida”, acho que seria com as coisas simples, brejeiras, as que normalmente nem mostro. Também valem o meu precioso tempo os projetos que mexem com o meu coração - o equivalente à massa al dente que comentei.
Nesses projetos, eu me demoro. Reviso a receita e recomeço tudo se notar algo coalhado ou com gosto de queimado. Com a mão na massa, cada vez mais aprendo a reconhecer e a me dedicar aos meus “pratos-estrela” - passíveis de aperfeiçoamento, mas sempre servidos a tempo porque o salão não pode esperar.
Você reconhece quais são os seus? Uma dica: só lá na cozinha para descobrir.
PAUSE PRA CRIAR
Miniguia de presença digital para quem detesta aparecer
Ok, então você preferiria sumir da rede social, não criar conteúdo, não aparecer no vídeo, não opinar. Somente acompanhar uns perfis para se entreter, de vez em quando aprender sobre alguma novidade e ponto. Amaria voltar aos hábitos dos anos 1990, mas sem perder as benesses do seu smartphone, sabe como é. Apenas se livrar dessa chuva de mensagens te interrompendo e fazer desaparecer a incômoda demanda por presença digital como requisito profissional.
Não queria - vamos expressar o que você está pensando no fundo do coraçãozinho - não queria se sentir obrigada a virar blogueira. Muito menos blogueira não remunerada, né? Porque às vezes a gente se sente assim: pondo a cara no vídeo, as ideias pra jogo e o conhecimento no mundo de graça, em troca de nada.
Ufa, mais leve?
Escuto essas reclamações há anos e continuarei a escutar, de clientes, parceiros, amigos e leitores, tenho certeza, por muito mais tempo.
A ideia de se posicionar nas redes sociais de forma intencional, pensada, é sedutora para uma minoria que se atrai por comunicação e às vezes por fama. Para o restante do mundo, é um ônus dos novos tempos.
Ônus inexorável, preciso informar. Mesmo se a pessoa não tiver vocação para se expor e odiar uma mídia social mais visual, como o Instagram, ou mais frenética, como o Tiktok, hora ou outra vai acabar se rendendo a alguma plataforma (talvez como esta aqui, o Substack). Por quê? Porque a pressão por presença digital vai ser cada vez mais eminente nas nossas vidas e porque, de fato, isso faz diferença no âmbito profissional.
A conversa hoje é sobre detestar a ideia de aparecer, mas encarar a realidade acima. Encarar não significa gostar, nem se render completamente a ela. É se abrir a achar seu lugar nisso tudo.
Primeiro trato: o online é inescapável; a superexposição, opcional.
Você aí, que prefere o bastidor (a cozinha, para usar a metáfora do texto anterior). Você mesmo, que não se gosta no vídeo, demora uma vida para criar conteúdo, se sente invadido, inferiorizado ou exausto em redes sociais. Que detesta polêmica, fica ansioso só de pensar no algoritmo, não tem tempo, saco nem cabeça pra postar. Você que sente tudo isso ou rejeita a “blogueiragem” como escada profissional. Você não vai mudar o mundo reclamando. Tampouco precisa se violentar para entrar na dança.
Precisa, apenas, começar a abrir a mente e a se testar.
Vou mandar a real, antes de você torcer de novo nariz.
O mercado hoje, infelizmente, valoriza profissionais mais bem posicionados digitalmente. Pessoas que elevam a sua reputação nos meios digitais conseguem mais oportunidades, financeiras ou não. Profissionais que se tornam “marcas pessoais” - nomes maiores que seus cargos - transcendem a barreira das vagas disponíveis e galgam novos postos; quiçá abrem empresas e prosperam graças ao seu posicionamento particular.
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