Assisti a uma série que sabia ser uma piada no primeiro um minuto e meio. Dez capítulos, incoerências de roteiro, personagens chatas, o final apresentado da maneira mais previsível. Logo eu que defendo que a vida é curta demais para terminar livro ou filme ruim, hein? Mordi a língua e finalizei 12 Jurados, na Netflix, com a delícia desgostosa que só a perda de tempo deliberada traz. Deliberada, veja bem.
Estou terminando de assistir a The Office pela terceira vez, seguindo a mesma linha. Com a diferença que cada diálogo ali vale a pena.
Passei a seguir um perfil que mostra a mesma cena todos os dias de manhã, um jornalista que ganha a cara do anti-herói psicopata do The Boys depois de alguém esbarrar nele. Montagem propositadamente tosca, com a cara da velha internet. Todo dia dou uma risadinha mental quando aquilo pula no meu feed.
Como bem disse um amigo recentemente, e faço as dele minhas palavras, meu feed do Instagram virou o National Geografic, ofertando vídeos de lontras e elefantes fofíssimos, cachorros engraçadinhos, gatos com personalidades forjadas por seus donos e corujas virando a cabeça. O algoritmo me entregando o que mais faz meu olho parar na tela hoje, nada diferente disso.
Tchau, cérebro, até amanhã
Sei que não estou sozinha na busca por escapismo. É uma tendência que se reflete em tudo, da moda ao consumo, e paradoxalmente preenche nosso tempo fugidio com um pouco de vazio. Mais do mesmo ou “brainless content".
Até os problematizadores se cansam de problematizar, ainda mais quando percebem que suas palavras jogadas no virtual se misturam às de outros e tudo cai na mesma vala, a do blá-blá-blá, sem pesos nem medidas. Às vezes, os problematizadores só concordam com um “aham”, engolindo qualquer groselha, e saem para contemplar. Vão desligar o cérebro de forma ativa.
Prazeres que para uns são culpados mas, para mim, são perfeitamente permitidos. Necessários, até.
Conheço muita gente que reassiste a séries e filmes para relaxar, já que não precisa prestar tanta atenção: ajuda a dormir, até. Há inúmeras pessoas que precisam mais memes que de comida, para que as piadas com suas próprias dores curem um pouco do que o dia a dia não consegue.
O besteirol mais ou menos óbvio abunda nos nossos feeds e na TV. Há público, cada vez mais público.
Autopromoção: ninguém liga
Curioso observar que, em meio a esse apagão mental e ao amadurecimento das redes sociais, tantas pessoas AINDA acreditem que é relevante carregar para o Instagram (e para eventos, e cafés, e mesas com drinks e vinhos!) o velho espírito LinkedIn. Falo da pura e simples autopromoção ou do que se traveste de conteúdo útil para contar vantagem. Falo ainda da competição por quem realiza ou ganha mais, do papo que leva tudo para o viés prático: deixa comigo, eu tenho um contato etc.
Ah, me devolve aquela série péssima agora, eu imploro!
Ninguém vai te falar. Quer dizer, eu vou: o “eu-eu-eu” profissional gera rejeição, assim como reclamar demais da vida, a menos que a pessoa já tenha construído uma sólida comunidade. Trata-se de uma tendência do ser humano fugir de ambos os tipos: o egocêntrico e o reclamão. Podemos ser delicados ou encarar quando são familiares, mas no fundo não queremos estar perto. A torcida pelo outro e a empatia, segundo pesquisas, têm limites.
Quem nos acompanha ou convive com a gente está, lá no fundo, querendo saber de si. Essa é a maior sacada de branding pessoal que existe.
A criatura deseja se desligar e não se sentir mal achando que você está esfregando que é melhor que ela, ou vendendo uma promessa falsa. Na verdade, a maioria das pessoas não está nem aí para você nem pra mim. Quer encontrar algum prazer, um alento para as suas questões ou um papo ou conteúdo de fato interessante (na sua perspectiva).
Na rede social, todas essas tendências pessoais tendem a se exacerbar porque a atenção fica mais difusa.
Seu post X mais uma lontra
A saturação dos indivíduos, que também é coletiva, resvala na maneira de produzir conteúdo. Ou deveria, para quem tem no digital uma ferramenta de trabalho. Por que mesmo você acha que postar a sua palestra ou um diploma novo é mais interessante que o doguinho de olho grande virando a cabecinha para o dono? Não é. Aliás, ele e as lontras estão competindo pela atenção com você e comigo nesse minuto.
Como consumidora de conteúdo e como quem trabalha com isso, afirmo sem dúvida: estamos e estaremos cada vez mais exaustos mentalmente, queremos a resposta logo e se ela esconder a pura vontade de aparecer tende a gerar repulsa. Estamos maduros para detectar os truques, lemos “por cima", crendo que adivinhamos os textos de tanta frase de efeito que ouvimos. Em geral, as pessoas só querem confirmar o que já pensam e gostam nas redes sociais.
Dá muito trabalho pegar o lugar dos bichinhos e ultrapassar essas barreiras de atenção todas.
Ainda assim, não acho que estejamos diante do fim de conteúdos úteis ou pensados. Creio que vamos conviver com todo tipo de coisa daqui pra frente, há espaço para diferentes modelos e profundidades.
Basta entender, para começo de conversa, que os conteúdos mais bacanas, via de regra, não são os de pura autopromoção.
Se você quer impactar alguém exausto deveria começar a pensar no próprio arcabouço emocional, tudo o que faz parte da sua marca pessoal - todos os significados em torno de você que fazem com o que os demais te vejam, te sintam de forma especial, diferente, se lembrem de você.
Quando os seus elementos mais sutis “conversam” com as sutilezas de quem te encontra geram uma conexão horizontal, humano para humano. Isso pode estar no seu jeito de falar, no seu visual, na história que você conta, num desgaste que você deixa escapar eventualmente, numa forma de escrever toda sua, num quadro engraçadinho que tomou coragem para fazer…
Não é simples, mas é perfeitamente possível.
Envolve tirar o foco de si e trabalhar um pouco mais esses neurônios à beira de um ataque de nervos para lembrar que existe alguém além de você. Alguém também humano.
Tem alguém do outro lado
Há que se considerar os vieses do público e o contexto em que ele está inserido: em que perfis deve estar fissurado no momento, quais tendências têm acompanhado, como será que ele está no dia de hoje.
E, volto a dizer, a mais universal das características de quem está ali consumindo conteúdo em rede social hoje é estar cansado como eu e você.
Traduza isso em comportamentos. Seguir a opinião da manada para não pensar muito, buscar séries repetidas ou similares, previsíveis, fugir de gatilhos de vendas, ter vontade de descansar o cérebro no fim do dia tal qual descansa as pernas ou as costas.
Seja num papo virtual, seja numa aula online, é bom recordar como se conecta com alguém para além da própria necessidade de aparecer.
Lembra?
Olhar para o outro, perguntar do seu momento, considerar suas dores e seus desejos. Falar coisas que interessem ao outro de um jeito que entenda e talvez empacotado num formato que seja confortável para ele. Ouvir o retorno. Tornar a troca mais fácil. Dar um afago no seu cérebro exausto, antes de estimulá-lo. Não manipular, não mentir, não ser uma mala.
Olha que baita começo!
Conheço pouca gente que consegue esse básico. Eu mesma falho de vez em quando, afinal, além de produzir conteúdo, também sou o público - e tenho que lidar com o meu cérebro cansado, interessado em posts alienantes de animais bonitinhos. Mas entre um gatinho e outro, veja só, tô aqui pensando em você :-).
Por que ser assinante PAUSE
Esta newsletter tem um ano e meio e se reafirmou recentemente como um local de textos e referências para pensar novos moldes de vida e de carreira. Ganhou o nome PAUSE para lembrar que às vezes é preciso pausar para continuar em movimento - seja descansando, repensando a vida, lendo, revendo conceitos, mudando a direção…
Estudo comportamento, branding pessoal, carreira, tendências e uso abundância de referências desde sempre. Isso está aqui. Depois do burnout que tive dois anos atrás, passei a olhar ainda mais criticamente para os temas que sempre estudei, e agreguei mais saúde mental, bem-estar e “relax” para o combo. Então isso também está aqui.
O resultado é esta newsletter, que passou a ter versão de assinatura paga (R$35 por mês).
E aí você me pergunta: por que eu deveria me tornar um assinante pago pela PAUSE?
Vou te explicar o que estamos criando aqui:
O maior benefício dos assinantes é fazer parte do Clube do Livro, na verdade, um Clube do Repertório, que começa com o livro “O Perigo de Estar Lúcida", da espanhola Rosa Montero. Vamos ler uma curadoria bem especial de livros e ter encontros no Zoom para falar deles, agregando mais referências para enriquecer a conversa. Inicialmente, pensei que precisariam ser encontros trimestrais, mas creio que é mais vibrante (e apaixonante rs) fazer em prazo menor.
Além da newsletter semanal, os assinantes recebem textos extras eventuais e exclusivos.
Apenas os assinantes eventualmente ganham descontos em encontros, cursos e aulas que eu lanço.
E, é claro, é uma forma de apoiar um trabalho autoral, que precisa de tempo, energia e suporte para continuar. A torcida agradece <3
Eu, o que faço e o meu Pause
Oi, eu sou a @brufioreti 🙂.
Jornalista. Especialista em branding pessoal e transição de carreira. Defensora do repertório amplo e do combo ler/escrever para viver melhor. Generalista por natureza, interessada em comportamento, neurociência, emoções, arte, feminismo, moda e tendências.
Tenho 20 anos de jornalismo como editora em grandes redações, cobrindo principalmente Cultura, Comportamento, Moda e Beleza: os lugares que mais me marcaram foram a Revista Glamour, onde fui redatora-chefe por 5 anos, e o Estadão e seu extinto primo paulistano Jornal da Tarde, nos quais passei 6 anos.
Sou das Humanas, mas trago números para me apresentar, veja você.
Tenho quase 42 anos de vida, 18 anos vivendo em São Paulo, 8 anos de empreendedorismo, 6 planetas no mapa em Libra, 2 casamentos, 2 gatos, zero filho.
Dezenas de cursos ministrados por mim, chuto pelo menos uns 15 como aluna entre pós e extensões. No mínimo 8 mil alunos e mentorados até aqui, palestras que não consigo mais contar.
Uns 5 projetos iniciados e não terminados, livro sendo escrito. Muitos porres nesta vida, poucos palpites sobre outras.
Um burnout pra conta e um sem-número de ideias pra dividir <3.
Nesta newsletter, tento sempre voltar à estaca zero e me lembrar do que realmente importa. Aciono o botão PAUSE e venho compartilhar sem pressa nem algoritmo coisas que me ocorrem gerundiando: vivendo, mentorando, botecando, estudando, ensinando.
Trago leituras, práticas e Clube do Livro para quem quer pensar novos moldes de vida e de carreira e sabe que pausar é o único jeito de continuar em movimento.
Ah, essa lição, aprendi com muita força depois de passar por um burnout e faço questão de levar adiante.
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