Essa newsletter brotou na minha mente quando assisti ao novo “Pinóquio”, uma das indicações no repertório de hoje.
A inocência do bonequinho de madeira, tão tocante, é a de todas as crianças que conhecemos e também a da criança que fomos um dia.
Aí me perguntei: um pouco dessa criancinha não merece ser resgatada? Aqui proponho um pulo nessa Terra do Nunca particular, no qual somos um lindo e glitterizado rocambole de curiosidade, fantasia e diversão - já fiquei mais lúdica, vai vendo…
Resgate comigo a minivocê e, se quiser, faça como eu ali adiante e poste sua versão criança feliz me marcando. Você sempre vai provocar um belo sorriso em alguém - em mim, certamente :-)
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Descarrego #6 | MiniVocê
"Faz um cheque, ué", eu respondia quando meus pais diziam que não podiam pagar alguma coisa. Pra mim, o talão resolvia tudo. Preenchia o valor e, voilà, era dinheiro: a enrolação pra fazer isso não fazia o menor sentido para a Bruninha de 4, 5 anos.
Ela também fantasiava muito.
Tinha uma botinha preta que amava usar todo dia na escola, mas, nos seus desvarios infantis, em casa ostentava uma coleção infinita de botas coloridas iguaizinhas às da Xuxa.
Amava uma tosquíssima espada de plástico com um líquido cheio de glitter e paetês dentro. Achava o instrumento fascinante! Para a Bruninha, aquela era a espada da She-ra, com superpoderes como fazer voar e deixar tudo ao redor brilhante. E tinha um cheirinho… bom, dá para sentir aqui agora.
Fora a caixa imensa de trapos das mais variadas cores e texturas, que usava para ser estilista da sua Barbie, a Kate (muita Sessão da Tarde inspirava nomes gringos, entenda). Barbie essa que rapidamente ganhou um estiloso corte chanel - feliz ou infelizmente para o resto da vida, porque só teve uma Barbie mesmo.
A Bruna criança fantasiava muito. Com espada da She-ra ou investigações criminais nas obras da vizinhança, ela escolhia ser feliz todo dia. Tinha a ideia fixa de não deixar a melancolia se instalar
Brincava de cozinhar com um lance chamado kit-frit, no qual se punha água e apertava uma sanfoninha para fazer barulho de fritura.
Era detetive investigativa nas casas que estavam sendo construídas ao redor; caçadora de cupins na pista de bibicleta com chão de barro na quadra de cima; uma espécie de contadora, mulher de negócios num escritório cheio de notas antigas e talões vencidos.
E, claro, era o que quisesse nos livros que emprestava na biblioteca, escolhidos demoradamente para ler rapidamente na rede que ficava na garagem da frente de casa. Cochilava toda vez, sonhava com o livro, voltava, sonhava acordada e se lembrava toda hora de que era feliz.
Escolhia ser feliz todo dia a menina; tinha essa ideia fixa de não deixar a melancolia se instalar.

Acima de todas essas fantasias e brincadeiras, a Bruninha daqueles tempos tinha a maior e melhor utopia: ela acreditava na felicidade humana e nas pessoas. Uma espécie de delírio comunista, você há de pensar.
A inocência de uma criança é algo que sempre emociona em primeiríssimo lugar porque todos já somos… fomos uma! E nos reconhecemos ali.
A emoção é bonita, embora agridoce, porque normalmente lançamos nosso olhar de adulto para aquela criaturinha que acreditava em tanta coisa mais falsa que Papai Noel, que às vezes não recebia a atenção devida ou que sofreu na escola por ser diferente em algum aspecto.
Mesmo quem não viveu nenhum trauma grave, teve uma sorte de decepções em algum nível, vai?! É da vida nos desapontar quando somos tão genuinamente abertos a vivê-la, como as crianças.
É da vida nos desapontar quando somos tão genuinamente abertos a vivê-la, como as crianças.
Mas não é justamente essa empolgação, essa energia infantil que faz tudo ficar mais pulsante e bonito? Com os grandes engajamentos emocionais vêm as grandes decepções, paciência.
Nosso eu criança está aí na memória para nos mostrar isso: a inocência nos abre para vivenciar o que há de mais puro e nos emocionar. Depois pode vir uma queda, mas não terá sido melhor cair do que nunca ter vivido aquela intensidade?
Você já deve ter lido algo sobre a criança interior ou até ter feito algum exercício de abraçá-la mentalmente, dar a ela colo, afeto, perdão. Explicar àquele serzinho que ele não tem culpa de ter sido enganado, de ter confiado nas pessoas, que a sua pureza é uma coisa boa sobre ele. Se não fez, recomendo. Aquela criança está querendo ser vista e ouvida no caleidoscópio atemporal que é a memória. Ali ela vive e saltita e fantasia à vontade, mas também chora, se sente abandonada e se pergunta onde errou.
Essa criança ainda é a gente; a gente ainda é essa criança.
Essa criança ainda é a gente; a gente ainda é essa criança.
Quando fiz um desses treinamentos no qual encontrava a Bruninha, achei a pobrezinha dentro de um armário do quarto chorando e observando uma frestinha de sol. Ela se sentia profundamente só, mas estava todo mundo lá de alguma forma. Era só a pequenininha sair e pedir que a vissem! A Bru abraçou a Bruninha, explicou que ela não estava abandonada, não, que o Sol era todo dela e que podia sinalizar quando precisasse de carinho, não carecia se esconder.
Bem, as duas ainda estão trabalhando nisso…
Enquanto a solidão mesmo na multidão não some, estou preparando um palco (porque, paradoxalmente, ela adora) e trazendo a minha Bruninha aqui para fantasiar um pouco mais, voltar a fazer mil vozes engraçadas, me encher de energia e de otimismo.
Vou pedir a ela pra me contar como é ser inocente e acreditar mais nas pessoas de novo. Ela é sagaz e há de me dar ótimas razões!
Cadê a minivocê?! Chama pra festa, chama pra ganhar amor e trazer aquela vontade de recomeçar todo dia!
A miniBru é uma comunistinha delirante - perdoem os sonhos vintage, ela é dos anos 1980
A miniBru manda avisar que a sua mini e ela podem brincar qualquer hora. Já está construindo um céu de brigadeiro, separando trajes especiais feitos de nuvem e promete emprestar seu arco-íris de botas pra quem vier.
Coisa de uma comunistinha delirante - perdoem os sonhos vintage, ela é dos anos 1980.
Quer ouvir esse texto?
Clica a seguir para ouvir a versão desse texto narrada pela Bruninha… Ops, pela Bruna mesmo ;-)
Inocência inspiradora no Repertório
UMA ANIMAÇÃO
Pinóquio por Guillermo del Toro, disponível na Netflix, é uma animação em stop-motion que tira do óbvio a história do menino de madeira cujo nariz cresce com mentiras. Impossível não se apaixonar por esse Pinóquio hiperempolgado e talentoso, que faz tudo para agradar ao seu Papai enquanto descobre o mundo e a si mesmo. As incursões históricas - especialmente a ambientação na Itália fascista - trazem para a obra ainda mais camadas do que estamos acostumados, e nos fazem questionar as infâncias e adolescências roubadas pela guerra. A inocência está ali, mas tem uma aura meio sombria junto, de inocência perdida. Ah, gente, é tocante.
UM LIVRO
Falando em infância, não consigo ignorar a tetralogia que começa com A Amiga Genial, de Elena Ferrante. Você certamente já ouviu falar ou até leu e, embora eu não seja a leitora mais apaixonada, reconheço que a escrita e a história são altamente femininos e sensíveis. A chance de apreciar a relação da dupla de protagonistas nos arredores de Nápoles e ficar louca para saber mais é enorme, vai por mim. Para complementar, recomendo o interessantíssimo As Margens e o Ditado, da autora italiana, no qual ela conta suas referências, sua história com a escrita e os processos em torno dos seus festejados romances - um deleite para quem curte o bastidor criativo e a costura de repertórios para chegar até uma obra-prima.
UMA TRILHA
Se a sua criança é das minhas, essa trilha genial de Chico Buarque & cia. vai fazê-la ter um belo momento nostalgia. O disco da peça musical infantil Saltimbancos, originalmente lançado em 1977, conta a história de bichos que se rebelam contra a exploração de seus “patrões” e decidem fugir. Uma rebelião que conversa bem com crianças e, claro, nos faz pensar no contexto brasileiro em que foi lançada. Olhando mais ou menos para seu viés político, Saltimbancos é arte de alto nível.
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Reticências
"Por muito tempo preferi ser parecida com alguém do que me sentir sem traços" Elena Ferrante
“Lutei para escapar da infância o mais cedo possível. E assim que consegui, voltei correndo pra ela.” Orson Welles
Quer hablar de jobs?
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Eu e o que escrevo
Textos, indicações de repertório e erros são culpa minha mesmo, @brufioreti 🙂
Sou jornalista, especialista em branding pessoal e carreira multipotencial, tenho pós em Mkt Político, cursei coisas variadas, tipo Feminismo Pós-colonial, Neurociência, Psicologia da Popularidade e Positiva, Business Coaching e por aí vai. Trabalhei em grandes veículos de imprensa por mais de 17 anos até começar a ensinar e mentorar mulheres na seara da marca pessoal no digital e no trabalho. Adoro autodidatismo e defendo cruzar repertórios pra nos destacar e abraçar nossos "desencaixes" nesse mundo cheio de gente enquadrada. Ensino isso na prática no projeto Desencaixa, uma escola que mescla formatos e disciplinas com um TMJ constante! Pra dividir com mais gente a minha escrita e os meus desencaixes, faço esse Descarrego semanal! E no insta, mostro outros lados meus também, porque a gente é muito mais que o que pensa, trabalha ou diz. É o que sente e faz sentir 😉
Essa newsletter sai toda terça com um mix de texto lúdico e curadoria de repertório pra gente se soltar nas ideias e refs. Compartilhar faz MUITA diferença, então é só usar o botãozinho aqui:
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Que Bruninha mais fofa! Confesso que ir para a infância não é um lugar confortável dentro de mim. E eventualmente, quando penso em algo que hoje vejo como meu, vou tentando puxar para ver quando surgiu, e certas coisas vêm parece que de sempre!
💖Nossa Bru que texto lindo e colorido ! Eu sempre sonhei com o arco íris , nele ia encontrar meu pai que já faleceu há mais de 42 anos . Esses 42 anos sem ele não foram fáceis muito menos coloridos , a vida ficou dura ou melhor PB ( mas lembre-se que mesmo o PB tem sua beleza ) , a minha percepção sobre a vida mudou , e o riso e a inocência ficaram naquele cantinho guardados , junto com aquela menina que amava Roberto Carlos, fumar cigarrinhos Pam e dançar encima da enceradeira. Infelizmente ou felizmente essa caixinha transbordou , era tanta mágoa e terceirizações de uma vida que tudo virou um câncer no seio e de lá pra cá muita coisa aconteceu , mudou ou melhor , limpou mesmo .
Vivo hoje em uma faxina interna . As vezes consigo , as vezes não … mas para debaixo do tapete nada mais vai . Me busco ainda pequena , uma hora vamos nos encontrar e zerar esse hodômetro .
Mas como Deus é bom demais comigo e o arco íris existe sim , sigo aqui curada, com algumas feridas ainda que busco exterminar ; mas sigo em busca daquela Tetê ( que a minha vó carinhosamente me chamava ) feliz, criativa, que tinha sonhos grandes, amava o belo e queria mudar o mundo. Apenas mudar o mundo Que a gente deixe de ser esse monte de adultos chatos e cheios de achismos para voltarmos a nossa essência , a do riso solto e alto .
Um brinde de café com vc .
Beijus meus
Stela 💖