Já fui das exatidões porque já fui jovem.
Hoje sou das incertezas e dos "veja bem" embora isso não combine com a minha casca grossa de 40 e poucos anos nem com a minha fama de má - cheia de opinião, chatinha de discutir, generalista.
Eu amo as palavras, elas me dão dão norte e desenham aquilo que o desenho não mostra. As palavras são a minha ferramenta (arma?) favorita porque me permitem pôr os pingos nos is com o máximo de exatidão possível.
Mas ando pensando se essa exatidão não seria frágil feito casca de ovo…
palavras inexatas
Fora do universo das palavras, as coisas são inexatas, sem contorno definido. Uma palavra não determina nada, ela não se dá bem sozinha, precisa de outras para formar um sentido robusto.
As frases estão aí para comprovar.
Gostamos de dizer, por exemplo, que “não” é uma sentença completa - e costumo defender essa ideia -, no entanto, na prática, sabemos que o entendimento alheio passa por construções psicossociais que fazem um não virar um talvez e até um sim. O não acaba precisando de apoio gestual, entonação específica e outros contornos para se empossar dele mesmo aos ouvidos ou aos olhos alheios.
Palavras, ando descobrindo, só são realmente singulares em seus plurais. Andam aos bandos, senão emagrecem até virar um fiapo difícil de decifrar.
Essa percepção aflorou para mim em tempos de banalização de termos na avalanche de conteúdo nas mídias digitais.
E uma palavra me veio à mete.
solitude, a moda
Estou aqui, para usar o termo que as mídias sociais gostam hoje, vivendo a minha SOLITUDE num fim de semana, enquanto empilho palavras.
Supostamente essa solitude é boa: introspectiva na medida, calma sem ser tediosa, preenchedora de vazios. É um desfrute, uma bênção que precisa ser cultivada. Precisa, sim. Só que, na prática, é irmã univitelina da solidão.
Solitude, solidão, solilóquio, soli-qualquer-coisa.
Solitudo é agridoce.
Deleite sofrido, sofrimento prazeroso.
É bom estar só quando a gente quer e ainda assim tem algo de dor na não presença de alguém. A solidão (e sua irmã solitude) agiganta as não presenças - algumas vezes com um majestoso "graças a deus" na sequência; outras, com um nó na garganta que não sai nem tossindo.
Eu amo ficar só. Eu odeio ficar só. Tudo junto.
eu sempre vou junto
Você se identificou com isso?
Pergunto genuinamente, porque em minha “solitude” aqui penso que a intensidade da minha própria companhia talvez seja a pimenta por trás dessa suposta contradição.
Ô companhia palavrosa!
Uma vez li um livro do Alain de Botton no qual ele alertava para a questão de fugir de tudo no que ele chamava "arte de viajar" - quando viajamos, nós vamos juntos.
Sempre sorrio para o espelho quando me vejo flertando com a rabugice depois de muito tempo na minha companhia indivisível de solidão, de solitude e de multidões também.
Ela - eu - sempre está aqui, assoprando inconveniências e observações intuitivas ou apuradíssimas, nunca se cala, nem no sono! Eu gosto disso nela, um espetáculo, mas vez ou outra me dá nos nervos.
Assumir que as rosas têm espinhos é libertador num mundo em que parece termos a obrigação de estar felizes toda hora, no coletivo ou sozinhos.
Tenho certeza de que alguém me lê neste momento e pensa: ah, eu não, eu sempre amooo a minha companhia! É mesmo? SEMPRE, alecrim dourado, prateado, bronzeado!?
Bem, eu também gosto da minha presença, até porque nunca experimentei a quietude da minha não presença. Só que o (auto)amor não é só sorrir e pisar nas nuvens - para isso damos outro nome, o de “autoengano”.
Ah, mas são só palavras. Juntas, elas me lembram que todo mundo é sozinho, e todo sozinho é uma multidão.
Dá licença que vou voltar à minha “solitudo” aqui… e não me mexe comigo que não ando só.
Eu e o que escrevo
Textos, indicações e erros são culpa minha mesmo, @brufioreti 🙂
Sou jornalista, fissurada por ler e escrever desde pequeninha. Trabalho hoje com branding pessoal e posicionamento digital com foco na carreira, além de dar palestras, treinamentos e cursos para empresas.
Tenho pós-graduação em Mkt Político, cursei coisas variadas, tipo Feminismo Pós-colonial, Neurociência, Psicologia da Popularidade e Positiva, Business Coaching e por aí vai.
Trabalhei em grandes veículos de imprensa por 17 anos até começar a ensinar e mentorar mulheres na seara da marca pessoal no digital e no trabalho. Adoro autodidatismo e defendo cruzar repertórios pra nos destacar e abraçar nossos "desencaixes" nesse mundo cheio de gente enquadrada. Ensino isso prática em palestras, treinamentos em empresas, colaborações e cursos.
Pra dividir com mais gente a minha escrita e as minhas ideias, faço esse Descarrego semanal, que traz reflexões e desabafos sobre questões contemporâneas que nos afligem ou acolhem.
No insta, mostro outros lados meus também, porque a gente é muito mais que o que pensa, trabalha ou diz. É o que sente e faz sentir 😉
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